XVIII Congresso da ABRALIC, em Salvador (10 a 14 de Julho de 2023).
O simpósio é interdisciplinar e são bem-vindas comunicações, atuações, performances que lidem com o tema na multiplicidade das suas abordagens e perspectivas. Qualquer língua é bem-vinda, a nossa proposta completa segue.
Inscrições, até 8 de Janeiro, aqui: https://abralic.org.br/lista-simposios/
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“Diversos regimes políticos têm sido historicamente contestados e desconstruídos através das expressões artísticas. Tanto os movimentos de contracultura como as literaturas militantes, resistentes e de protesto têm disputado, com as culturas hegemônicas, epistemologias e formas de viver e pensar socialmente. As lógicas do capitalismo contemporâneo tendem a operar os processos de silenciamento e marginalização de determinadas vozes, costumeiramente racializadas e localizadas.
Como a literatura pode proporcionar imaginários para além das lógicas capitalistas? Ou ainda: como a literatura pode se posicionar na potencialização das “encruzilhadas” (Martins, 2022), que questionam a própria estrutura colonial de divisão das linguagens artísticas? Usualmente, como herança de uma tradição colonial fortalecida pela sistematização universitária, a criação artística disciplinada e segmentada depara-se com fronteiras e limites intitulados: literatura, artes visuais, cinema, teatro, dança, performance, etc. Por outro lado, próprio do antagonismo classista, as criações também são hierarquizadas em eruditas, populares, urbanas ou, ainda, em artes profissionais e amadoras. Tais formas de organização da produção artística e dos saberes reproduzem formas de conceber o mundo herdadas das relações de subalternidade coloniais que ecoam no sistema capitalista, caracterizado pelo desenvolvimento combinado e desigual (WReC, 2015).
A construção de narrativas, sejam elas literárias, históricas, sociológicas, é ela própria um ato performático, em que formas de entender, conceber, imaginar o mundo ampliam vivências e potencializam representações possíveis da comunidade presente, mas também abrem para os campos das comunidades futuras. Assim, pesquisas naqueles campos de investigação têm potencial de explicitar as contradições do capitalismo e suas desigualdades variadas. E de apresentar as soluções e enfrentamentos protagonizados pelos velhos e novos “condenados da terra” (Fanon, 1961). Se nem sempre exitosos, não se podem desprezar as “pequenas vitórias”; se desaparecidos pelas violências sofridas, devem as pesquisas e as produções artísticas servir como arquivos, para informar os novos movimentos sociais e os descentes de projetos políticos e estéticos.
As variações do anticolonialismo, anticapitalismo, do antirracismo e antisexismo se atualizaram nas agendas políticas e estéticas dos movimentos negros, de trabalhadores, lgbts, de mulheres de que formas no mundo contemporâneo? Interessamo-nos, assim, por circulações artísticas e literárias de gerações anteriores, e pela forma em que as redes geradas por escritores e artistas – políticas, de amizade e solidariedade – compartilharam, frequentemente, práticas estéticas, apesar de divergências internas. Longe disso ser sinónimo de homogeneidade, as redes internacionais, sempre provisórias e em devir, aturaram na interseção das lutas. Apesar de serem profundamente influenciadas pela repressão política, por situações neocoloniais ou coloniais que impactaram a circulação de textos, pessoas e ideias, essas redes revolucionaram a compreensão da literatura, da política, mas também das representações de África e das suas diásporas.
Este simpósio pretende ser um espaço de discussão e partilha de construções de linguagem, narrativas ou não, bem como uma possibilidade de pensar a partir de produções literárias não canônicas e/ou não hegemônicas. São bem vindos os trabalhos poéticos em interface com a linguagem da performance e da presença, cuja expressão transborda espacialidades e sensibilidades áudio sonoras, visuais, arquitetônicas, etc. Nós referimos, neste sentido, à literatura em sentido amplo, na qual entendemos acolher diferentes formas de linguagem que se envolvem, são afetadas ou são motivadas pela palavra. Encorajamos, especialmente, comunicações que reflitam as produções africanas, afrodiaspóricas e indígenas criadas e/ou protagonizadas por mulheres, outras identidades de gênero ou sexualidades resistentes às lógicas cisheteronomativas.
O painel está comprometido, neste sentido, com os recentes debates sobre as várias camadas de resistência, nas suas múltiplas intersecções, que atuam contra os mecanismos de silênciamento histórico, construção e reprodução de subalternidades baseadas, entre outros, em fatores de raça, classe e gênero (Oyěwùmí 2003; Vergés, 2019; Hooks, 1981; Davis, 1981). Enxergamos essas questões de forma também interdisciplinar, recorrendo a recortes que dialogam com os campos dos estudos literários, artísticos, históricos e sociológicos. Nosso intuito é o de desestabilizar campos do saber fechados e pré- estabelecidos que reduzem, necessariamente, as complexidades, tensões e contradições de produções artísticas, literárias e intelectuais contra-hegemónicas nesses contextos. Formas críticas de pensarmos sobre o passado e as narrações à volta deste passado, nos permitem adentrar as malhas da colonialidade, enxergando as literaturas de resistência do passado na sua conexão com práticas artísticas e sociais do presente e as formas possíveis de imaginarmos um futuro comum para além das lógicas capitalistas e das opressões por elas geradas. “
Apoio: Rádio Internacional em Português Associação Arte e Cultura em Língua Portuguesa.