Meu nome é Beatriz, tenho vinte e um anos e sou a criadora da página @silenciosa.mente. Sou brasileira e moro em uma cidade no interior do estado de Minas Gerais. Hoje, curso Psicologia e consigo dar voz à luta feminina. Nutro a página com pouco mais de trinta e seis mil seguidores, lendo, ouvindo e acolhendo desabafos de homens e mulheres de todas as idades. Busco servir da maneira que eu posso. Meu objetivo é ser alguém para quem não tem ninguém. Todos os dias eu procuro encorajar pessoas a cuidarem da sua saúde mental, tanto quanto cuidam de sua saúde física. Hoje consigo olhar para o meu interior e ter a certeza de que esse é o meu propósito, minha razão. Servir, ajudar, abraçar, com empatia e respeito, sem julgamentos. Mas nem sempre foi assim. Sou pianista e violinista. Desde criança o meu lado artístico foi incentivado. Participei de festivais, tocando em orquestras em outros estados brasileiros. Porém, eu sabia que a música não seria a carreira que eu gostaria de seguir. Muito influenciada pelos meus pais, comecei a cursar Licenciatura em Música em uma universidade privada logo após minha saída do Ensino Médio escolar. Passei a lecionar violino para crianças, adolescentes, adultos e idosos, ao mesmo tempo em que fazia a faculdade. Com o decorrer dos anos, comecei a pensar em outras possibilidades de cursos. Mas a minha lista de opções não era extensa. A única coisa que havia aprendido intensamente durante os longos anos da minha vida era música, em suas diversas formas e áreas. Passei alguns meses refletindo muito sobre o que eu realmente queria e gostaria para o meu futuro. Remexi meu passado e me lembrei de questionamento que tinha quando era criança: “Qual é o meu dom? Qual é a razão da minha existência? O que posso fazer para acrescentar algo no mundo?”. Nesse momento, eu precisei enfrentar todos os acontecimentos da minha vida. E apesar da aparência feliz, satisfeita e completa que eu passava, não era dessa forma que eu realmente me sentia. Nos bastidores da minha própria vida, tudo acontecia de forma muito diferente. Fui criada peculiarmente, com diversas restrições e repressões dentro de uma religiosidade bem privativa. Não tinha vida própria. Eu vivia aquilo que as pessoas projetavam, sem ter de fato uma identidade. Escondia-me atrás da Música para não enfrentar meus medos e ser exatamente o que haviam planejado para mim. Nunca me senti no direito de questionar ou discordar das imposições e contenções. Aos dezessete anos, comecei a me relacionar com um garoto. Sentia-me importante, responsável, independente, madura. Mas eu não enxergava que estava em um labirinto de manipulações, mentiras e abusos. Após oito meses, com o fim do relacionamento, fui culpada por cada acontecimento infeliz. Não entendia o que havia acontecido com minha essência, o porquê de tudo estar tão confuso, a pressão no peito e a falta de ar que eu sentia. Então, tomei coragem e pedi à minha família que me levassem em um psicólogo. Mesmo com o imenso tabu que existia (e ainda existe) sobre tal profissão, acolheram meu pedido. A minha primeira visita a uma psicóloga foi assustadoramente maravilhosa. Eu não sabia que minha saúde mental importava tanto e que os meus comportamentos eram reflexo do que acontecia em minha mente. Ao relatar o término do meu antigo relacionamento, fui comunicada que havia sido vítima de um relacionamento abusivo. E então, tudo começou a fazer sentido. O medo, a culpa, as intolerâncias, a falta de respeito, as discursões infundáveis, o ciúmes extremamente possessivo e doentio, a forma agressiva de lidar com as situações e o controle emocional tiveram, enfim, uma causa. Revivi as manipulações e as mentiras. De fato, eu estava cega. A forma opressora da minha criação juntamente aos acontecimentos abusivos da antiga relação foram somatizadas e contribuíram para a minha necessidade de um acompanhamento psicológico profundo. Fui diagnosticada por psiquiatras, com Transtorno de Ansiedade Generalizada, Transtorno Depressivo e Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC). Aos dezenove anos, eu descobri finalmente, em terapia, que eu tinha o direito de pensar por mim mesma. Eu poderia definir meus valores, minha moral, meus objetivos, minhas crenças, meu futuro e me responsabilizar pelos meus atos. Precisei enfrentar os fundamentos religiosos para expor o que eu escolheria para a minha vida. E durante todo esse processo, eu recebi todo o reconhecimento, apoio e compreensão da minha família. Isso foi, sem dúvidas, parte essencial da minha caminhada. No decorrer dos meus acompanhamentos psicológicos, me encantei pela profissão. A empatia e o respeito eram imensuráveis e não me senti jugada em nenhum momento. Após algumas pesquisas e muitas lágrimas (finalmente, eram lágrimas de felicidade), eu desisti do meu curso de Licenciatura em Música no qual faltavam apenas dois semestres para finalizar, e concentrei toda a minha emoção e energia no curso de Psicologia. Em 2020, um vírus potente e desconhecido tomou conta do nosso planeta. As aulas deixaram de ser presenciais e a sessão de terapia passou a ser através da tela do celular. Lembro-me de como meus sintomas pioravam, das inúmeras vezes que pensei em desistir e do aperto no peito da saudade dos entes queridos. No dia primeiro de março do mesmo ano, minhas emoções estavam mais intensas. Sentia a ansiedade e a tristeza correndo no meu sangue. E de repente, tive a ideia de criar uma página no Instagram, com o objetivo de receber desabafos de pessoas que estavam na mesma situação que eu (ou talvez até piores). Eu não tinha pretensão de continuar nutrindo a página, não tinha noção da proporção que tomaria. E num piscar de olhos, a página ganhou vida e eu descobri a resposta daquelas perguntas que eu me fazia quando criança. O meu objetivo é servir, ajudar, refugiar, acolher e amparar pessoas que estão passando por alguma dificuldade. Apesar da Psicologia me ajudar no processo de ampliação da empatia, não faço uso de tal curso para vitalizar a página. Coloco-me sempre à disposição para ouvir ou aconselhar como amiga. Tudo ocorre no sentido literal da frase “Ser alguém para quem não tem ninguém”. Hoje, no sétimo semestre do curso de Psicologia, com pouco mais de trinta e seis mil seguidores e quase um milhão de contas alcançadas, persisto com o mesmo objetivo, incentivando a cuidarem de sua saúde mental e estendendo a mão para segurar quem está afundando. A ajuda é mútua e, de certa maneira, essa atitude influencia o outro a expandir o respeito e empatia que residem em cada um. Com a maior proporção do público sendo mulheres, tentamos disseminar a voz feminina como parte essencial do corpo social. Compartilhamos experiências semelhantes de abusos e agressões, simplesmente pelo fato de sermos mulheres. E isso nos dá força para continuar lutando pelo nosso devido lugar na sociedade, tão como a exigência ao respeito, que já é nosso por direito. A minha vontade é que todos sejam acolhidos e que saibam que não estão sozinhos. Apesar de toda maldade que há entre a humanidade, existem pessoas que se importam com a vida do outro. E é exatamente isso que eu procuro mostrar todos os dias. A empatia é brotar em um peito que não é seu. Fico extremamente feliz por poder servir e ser suporte para as pessoas. Há quase um ano atrás, plantei empatia e hoje me emociono ao ver os frutos. E pretendo continuar assim: nutrindo o amor, a solidariedade e a esperança no ser humano.
Por: Mah Silva
Colaboradora brasileira da rádio internacional em português.
A rádio que fala a língua dos povos.
Tenho muito orgulho de você amiga. Você tem alcançado muitas vidas. Amo tu ❤️